PRIMEIRO CASO

PRIMEIRO CASO

ASN, 25 anos de idade, casada, foi internada 36 horas após proceder de Cancún (México) com seu esposo, após viagem de lazer. No período entre a chegada ao Brasil e sua internação, não saiu de sua casa; entretanto, manteve contacto com seus familiares.

Foi alertada, por intermédio de noticiário dos meios de comunicação, sobre o risco da epidemia pelo vírus influenza de origem mexicana. Procurou, por isso, serviço de vigilância epidemiológica, devido ao desenvolvimento de mal-estar, rinorreia e dor de garganta, iniciadas há menos de sete dias, ainda quando estava no México. Permaneceu sob isolamento até esclarecimento das suas queixas. Apresentava odinofagia inicial e rinorreia líquida e cristalina de pequena intensidade, além de mal-estar generalizado. Não teve tosse. A sua sintomatologia perdurou por 72 horas e regrediu rapidamente. Permaneceu por 10 dias em isolamento respiratório, em ambiente com pressão negativa, com dieta normal e medicação sintomática, constituída por analgésico-antitérmico. Em toda a sua internação esteve junto de seu esposo, que apresentava sintomatologia semelhante. Os familiares e o seu esposo, que mantiveram contato íntimo com a paciente, não foram contaminados pelo vírus Influenza (H1N1)2009.

Os exames complementares realizados – hemograma, proteína C reativa, função hepática e renal e radiografia do tórax – estavam normais. O vírus Influenza (H1N1)2009 foi identificado de suas secreções respiratórias altas.

O marido da paciente chegou ao hospital queixando-se de rinorreia e tosse seca leves; entretanto, com sintomatologia mais intensa do que a da sua esposa.
A paciente recebeu alta junto com seu marido transcorridos 10 dias após o surgimento da sintomatologia, já assintomáticos, e seguiram para a sua residência onde permaneceram sob vigilância epidemiológica.

COMENTÁRIOS

Este caso revela a evolução usual da infecção pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009, sem complicações, à semelhança da infecção pelo vírus sazonal, em que predominam as manifestações das vias aéreas altas, com poucas repercussões sistêmicas.  A apreensão inicial quanto ao risco da pandemia, que se encontrava em sua fase inicial, de abril a junho de 2009, determinou o isolamento dos pacientes.

Este caso clínico evidencia algumas das peculiaridades das doenças infecciosas, como: a rapidez de mobilização dos agentes infecciosos; a possibilidade de contacto íntimo inter-humano sem transmissão efetiva do agente; a necessidade perseverante da manutenção das medidas de vigilância sanitária, para impedir a disseminação das doenças; a necessidade de participação social e humanitária da população em risco para preservar a sua vida; a privacidade das pessoas diante de situações não-usuais, a conferir curiosidade, e a sua identificação com o inusitado; que revelam o risco planetário em todo o momento e de todos a conferir que a globalização em que vive o ser humano, nesta contemporaneidade, requer comportamento solidário em defesa da natureza.



SEGUNDO CASO

SEGUNDO CASO

LCP, 34 anos de idade, solteiro, apresentou, nas últimas 48 horas, rinorreia aquosa, procedente de ambas as fossas nasais, mal-estar, indisposição para o trabalho, temperatura corpórea axilar entre 38,5 até 39,5ºC e tosse seca. Negava contato com pessoas doentes nem havia viajado nos últimos 30 dias. Procurou Unidade de Pronto Atendimento, quando foi identificada temperatura axilar de 39ºC, hiperemia conjuntival periférica bilateral, rinorreia aquosa, mucosa nasal e orofaríngea também hiperemiadas. O restante do exame clínico estava normal, inclusive os seus dados vitais. Foi coletado espécime clínico procedente das fossas nasais e prescrito repouso relativo em casa sob vigilância epidemiológica, inclusive de sua família, com isolamento em seu quarto, afastamento das atividades do trabalho e uso de analgésico-antipirético.

COMENTÁRIOS

Há uma frase de grande significado clínico que é a seguinte: “Você só cumprimenta quem conhece; entretanto, na medicina, é necessário cumprimentar também quem não se conhece.” Isso indica que o diagnóstico precisa ser obtido – pelo menos a abordagem que direciona ao diagnóstico – e todas as possibilidades investigadas, antes de se estabelecer o diagnóstico final. Esse relato é tipicamente demonstrativo. Diante de um risco epidemiológico expressivo, o “médico não deve ser ingênuo” e entre as possibilidades diagnósticas deve ser incluída a doença prevalente e de risco.

O diagnóstico diferencial da síndrome gripal, na eventualidade dessa epidemia, deve incluir necessariamente a infecção pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1) 2009, sem desprezar outras entidades nosológicas comuns e prevalentes, e a situação epidemiológica (introdução de novo sub tipo de vírus influenza). Deve-se também observar o Protocolo de Manejo Clínico vigente que ao longo do tempo foi alterando o critério para coleta de material para exame diagnóstico. Atualmente são coletadas amostras apenas nos casos de SRAG com internação hospitalar e em casos de surtos por SG em comunidades restritas;



TERCEIRO CASO

TERCEIRO CASO

RS, 42 anos de idade, casado, tabagista, contato somente com familiares, apresentando mal-estar geral e síndrome febril, desenvolveu nas últimas 48 horas cefaleia retrorbitária intensa, temperatura de 38,5ºC, rinorreia amarelada, com escorrimento nasofaringeano de gosto desagradável. Procurou Unidade de Pronto Atendimento, sendo identificada mucosa do septo nasal avermelhada, entremeada de áreas esbranquiçadas e presença de secreção amarelada.

Os exames complementares realizados, como hemograma e radiografia do tórax, estavam normais. A proteína C reativa estava aumentada. O vírus Influenza (H1N1)2009 não foi identificado em suas secreções respiratórias altas. A radiografia dos seios da face revelou velamento de seio maxilar direito com nível hidroaéreo. Foi iniciada a administração de antibioticoterapia, além de vaporização e lavagem das fossas nasais com solução de NaCl 0,9%. Apresentava-se melhor no segundo dia de terapêutica, sem novas queixas, com normalização da temperatura corpórea. A cefaleia desapareceu em mais 24 horas de observação. O diagnóstico diferencial das doenças das vias aéreas é amplo e inclui: sinusite (viral, bacteriana, alérgica, leishmaniótica, paracoccidioidomicótica), neoplasia, doenças granulomatosas crônicas, inclusive tuberculose e hanseníase (além de leishmaniose). A possibilidade de confusão diagnóstica com pneumonias deve também ser avaliada, inclusive com tuberculose e associada com a asma brônquica. Neste caso, a procura do vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009 e a sua incorporação aos casos desta infecção foram feitas devido ao momento epidemiológico e às associações de patologias. Muitas entidades nosológicas – como rinopatia alérgica, sinusite (viral e bacteriana), pneumonia bacteriana (inclusive tuberculose), broncopneumonia – constituem diagnóstico diferencial da infecção pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009 e devem ser consideradas em seu diagnóstico diferencial. Não podem ser desconsideradas diante da situação epidemiológica em relação ao vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009. Ao contrário, devem ser realçadas.

COMENTÁRIOS

O diagnóstico diferencial das patologias das vias aéreas é amplo e inclui: sinusite (viral, bacteriana, alérgica, leishmaniótica, paracoccidioidomicótica), neoplasia, doenças granulomatosas crônicas, inclusive tuberculose e hanseníase (além de leishmaniose). A possibilidade de confusão diagnóstica com pneumonias deve também ser avaliada, inclusive com tuberculose e associada com a asma brônquica. Neste caso, a procura do vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009 e a sua incorporação aos casos desta infecção foram feitas devido ao momento epidemiológico e às associações de patologias. Muitas entidades nosológicas – como rinopatia alérgica, sinusite (viral e bacteriana), pneumonia bacteriana (inclusive tuberculose), broncopneumonia – constituem diagnóstico diferencial da infecção pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009 e devem ser consideradas em seu diagnóstico diferencial. Não podem ser desconsideradas diante da situação epidemiológica em relação ao vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009. Ao contrário, devem ser realçadas.



QUARTO CASO

QUARTO CASO

RSN, 27 anos de idade, casado, analista de sistema, natural e procedente de Belo Horizonte (Minas Gerais), com índice de massa corpórea (IMC) entre 30 e 40, sem uso de nenhuma medicação, não tabagista nem etilista, hígido até então, procurou atendimento médico ambulatorial devido ao aumento da temperatura corpórea, tosse seca, mialgia e rinorreia há três dias. Recebeu medicação sintomática e aconselhamento para manter-se em repouso relativo domiciliar.

Evoluiu, nos cinco dias seguintes, sem melhora clínica. Voltou a procurar atendimento médico. Foi examinado e submetido ao estudo radiológico do tórax, que revelou opacidade no lobo pulmonar inferior direito (Fig. 1), e os seguintes exames em amostra de sangue venoso: proteína C reativa (PCR) de 154,1 ng/dL; contagem por mm3 de leucócitos, neutrófilos, bastonetes, linfócitos, monócitos e eosinófilos, respectivamente, de: 5700, 4845, 161, 483, 322, e 57; hemoglobina de 14,3 g%, plaquetas de 202000/mm3.

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Figura 1:
Telerradiografia do tórax realizada antes da internação hospitalar. PA;
Fonte: Revista Médica de Minas Gerais – 19/2009 pg. 336

Foi iniciada antibioticoterapia com Levoflaxino. Na tarde do mesmo dia, ele procurou o Ambulatório de Referência para o Atendimento de Influenza (H1N1)2009. Foi coletado espécime clínico de secreção de nasofaringe e mantida a antibioticoterapia. O paciente foi orientado a permanecer sob isolamento domiciliar pelo Programa de Atenção Domiciliar (PAD).

Não houve melhora, ao contrário, desenvolveu dispneia. Três dias após, foi internado com frequência respiratória de 40 irpm, em uso de musculatura ventilatória acessória e com tiragem intercostal moderada. Apresentava dor torácica ventilatória-dependente; pressão arterial sistêmica (PA) de 12/8 cmHg; saturimetria de pulso (Sat. O2) de 65% em ar ambiente e 85% com oxigênio em máscara facial a 15 L/min. Realizou telerradiografia do tórax, que revelou infiltrados ou opacidades com broncograma aéreo disseminados em todos os campos pulmonares com o coração e os vasos da base normais (Fig. 2).

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Figura 2:
Radiografia em AP realizada no momento da internação no Centro de Terapia Intensiva;
Fonte: Revista Médica de  Minas Gerais – 19/2009  pg. 342

O exame de nova amostra de sangue venoso e arterial revelou, respectivamente, Lactato: 0,9 mmol/L, creatinina: 1,53 mg/dL, ureia: 72 mg/dL, PCR: 217,4 ng/dL; e pH de 7,39, pO2 de 36 mmHg, bicarbonato de 21,6 mEq/L. A Sat. O2 era de 77,5% com FiO2 de 0,25 com Sat. O2/FiO2 de 145, desidrogenase lática de 3177 U/L e creatinaquinase de 6324 U/L.

A antibioticoterapia foi modificada para a associação de Ceftriaxona com Claritromicina; foi iniciado Oseltamivir. A admissão hospitalar foi seguida, imediatamente, de instalação de intubação orotraqueal, realizada com grande dificuldade e submissão à ventilação mecânica (VM). Os parâmetros iniciais para a VM revelaram a necessidade de pressão expiratória final positiva (PEFP) de 20 cmH2O, fração inspirada de oxigênio (FiO2) de 100%, pressão inspiratória (PI) de 37 cmH2O, relação inspiração/expiração (I:E) de 1:1,5, com saturimetria (Sat.O2) de 75%. Surgiu hipotensão após a sedação para a entubação, revertida pela infusão de 1000 mL de NaCl 0,9% e Norepinefrina 10 mL/h. A sedação foi instituída de forma contínua. Houve o desenvolvimento de pneumomediastino e enfisema subcutâneo volumoso, reabsorvido após redução da PEEP para 16 cmH2O.

A elevação da creatinaquinase associou-se com a redução do volume urinário para menos de 500 mL/24 h e simultaneidade de elevação das escórias nitrogenadas sanguíneas, o que exigiu o início da terapia de substituição da função renal, por intermédio da hemodiálise, no quarto dia de internação hospitalar (DIH). O teste rápido para o vírus da imunodeficiência humana foi negativo.

Evoluiu com melhora da Sat. O2 e com estabilidade hemodinâmica. O resultado do exame virológico para o vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009 foi positivo.

O esquema antibiótico foi modificado, três dias após a sua internação hospitalar, para Cefepima e Claritromicina. A administração de Oseltamivir perdurou por sete dias. A antibioticoterapia foi novamente modificada no sétimo DIH, cinco e oito dias após a introdução, respectivamente, de Cefepima e de Claritromicina, por Vancomicina e Imipenam. A ampicilina foi adicionada dois dias após essa associação, devido ao crescimento de Enterococcus faecalis em hemoculturas solicitadas para o controle de infecção e de antibioticoterapia. Evoluiu com redução progressiva dos parâmetros ventilatórios para a manutenção de normoxemia. A traqueostomia foi instalada ao redor da segunda semana de ventilação mecânica. A temperatura corpórea apresentou tendência à elevação. Foi identificada a presença de Acinetobacter baumannii meticilina-resistente em aspirado traqueal, sendo acrescida à antibioticoterapia a Polimixina E, e suspensa a Ampicilina. Tornou-se afebril duas semanas após, coincidindo com a redução dos parâmetros de controle da VM, quando foi possível a descontinuidade da sedação. No vigésimo oitavo DIH, foram suspensas a Vancomicina e o Imipenam, e mantida a Polimixina E. Dois dias após, houve retorno da diurese efetiva, sendo interrompidas as sessões de hemodiálise. A Polimixina E foi suspensa quatro dias após. Nessa época, a amostra de urina coletada para urocultura revelou a presença de Enterococcus, o que requereu a reintrodução de Ampicilina quatro dias após a retirada da Polimixina E. Evoluiu sem sedação, afebril, com diurese espontânea e estabilidade hemodinâmica. O paciente tolerou bem a descontinuação da VM. Recebeu alta da terapia intensiva uma semana após, sendo necessária oxigenioterapia a 1,5 L/min. Manteve-se com cognição normal, colaborativo, em recuperação da retenção de escórias nitrogenadas, com movimentação preservada. No sexto dia de uso de Ampicilina, surgiram aumentos transitórios da temperatura corpórea, sendo novamente introduzida a Polimixina E, associada com a Ciprofloxacina. O estudo pela tomografia computadorizada revelou consolidações acompanhando os feixes broncovasculares nos lobos superiores, língula e lobo médio, provavelmente relacionadas à infecção, não necessariamente em atividade, podendo corresponder a imagens residuais, não sendo possível afastar a possibilidade de superposição de processo cicatricial fibroso (Fig. 3 e 4).

Como exercício, seria interessante responder às seguintes questões:

Como reconhecer a gravidade evolutiva da síndrome gripal? Quais as providências terapêuticas iniciais diante de paciente com insuficiência respiratória grave? Como estabelecer plano de abordagem ao suporte ventilatório e de suporte hemodinâmico para paciente com SRAG? Quais os agentes etiológicos bacterianos que complicam a evolução da pneumonia virótica em paciente com SRAG? Quais os parâmetros ventilatórios mais adequados para o estabelecimento de VMI? Como situar a VNI em paciente com SRAG?

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Figura 3:
Radiografia em AP uma semana após a internação no centro de Terapia Intensiva;
Fonte: Revista Médica de Minas Gerais – 19/2009 pg.345

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Figura 4:
Tomografia computadorizada realizada dois meses após a admissão ao hospital;
Fonte: Revista Médica de Minas Gerais – 19/2009  pg. 346

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Figura 5:
Tomografia computadorizada realizada dois meses após a admissão no hospital.
Fonte: Revista Médica de Minas Gerais – 19/2009 pg.347

As hemoculturas revelaram a presença de Candida albicans, o que requereu a administração de Fluconazol venoso por duas semanas. A Polimixina E e o Ciprofloxacino foram suspensos quatro semanas após terem sido introduzidos. O ecocardiograma transesofágico e a ultrassonografia abdominal estavam normais. A tomografia do tórax revelou, nessa época, bronquiectasias residuais e áreas de sequelas de síndrome de angústia respiratória do adulto. Permaneceu afebril, e a cânula de traqueostomia foi retirada próximo de sua alta em cerca de três meses após sua internação hospitalar. As alterações fibróticas reveladas à tomografia computadorizada do tórax não se acompanharam, pelo menos, até quatro meses após a sua internação hospitalar, de repercussões identificadas à avaliação clínica.

COMENTÁRIO

Este relato descreve a evolução de paciente adulto jovem, com sobrepeso, infectado pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009, que evoluiu com Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), com recuperação em 68 dias de evolução sob internação hospitalar. Contaminou-se ao redor da vigésima terceira semana epidemiológica da pandemia pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009, sem contato com caso suspeito ou confirmado desta infecção. As alterações clínicas iniciais foram: aumento da temperatura corpórea, tosse, mialgia, rinorreia e opacidade no lobo pulmonar inferior direito, com PCR elevada e linfocitopenia, sem leucocitose, neutroflia ou desvio para a esquerda.

Desenvolveu, em sete dias de infecção, insuficiência ventilatória e opacidades radiológicas difusas pulmonares com área cardíaca normal, retenção de escórias sanguíneas, relação Sat. O2/FiO2 de 145 e aumento de enzimas musculares. Foi necessária a substituição da função pulmonar e renal, respectivamente, pela VM por 41 dias, e hemodiálise por 27 dias.

Contraiu infecções hospitalares associadas ao Enterococcus faecalis, Acinetobacter baumannii meticilina-resistente e Candida albicans. A VM requereu parâmetros caracterizados por PEFP entre 25 a 30 cmH2O, FiO2 de 100%, PI de 37 cmH2O, e I:E de 1:1,5. Evoluiu com mais de 15 pontos da escala APACHE II. Desenvolveu instabilidade hemodinâmica revertida pela infusão de volume e de vasopressor.

Sua recuperação não deixou sequelas renais; todavia, coincidiu com o desenvolvimento de áreas difusas radiológicas de bronquiectasias. A evolução clínica seguiu uma ordem de acometimento inicial das vias aéreas superiores e inferiores, seguida de insuficiência nefropulmonar aguda, associada com a síndrome de angústia respiratória do adulto, rabdomiólise, insuficiência renal aguda e infecções hospitalares. As repercussões da fibrose pulmonar observadas ao estudo tomográfico do tórax só seriam identificadas de forma pormenorizada com o acompanhamento a longo prazo do paciente; entretanto, não foram capazes de provocar repercussões clínicas que determinassem alguma limitação funcional.

COMENTÁRIOS GERAIS SOBRE A EVOLUÇÃO DA SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE (SRAG)

Os achados clínicos disponíveis sobre a SRAG, associada à pandemia pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009 em todo o mundo, não foram suficientes para diferenciá-la da infecção pelo vírus Influenza sazonal.

No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, a faixa etária preferencial dos pacientes variou entre 13 a 47 anos, sendo, em 20% das vezes, associada com a presença de pneumonia bacteriana secundária e de alguma comorbidade, como hipertensão arterial sistêmica, asma, apneia do sono obstrutiva, sobrepeso, gravidez e diabetes mellitus. O intervalo de tempo entre o início da sintomatologia e a admissão hospitalar foi de 4 a 25 dias (média de seis dias). Todos os pacientes tinham febre, com temperatura superior a 38ºC, tosse, dispneia ou insuficiência respiratória.

A evolução para pneumonia lobar ocorreu, em geral, em sete dias após o início da sintomatologia da influenza, e a necessidade de intubação orotraqueal em menos de 24 horas após a internação hospitalar. O óbito decorreu da falência orgânica múltipla (FOM), observando-se a sua associação com rabdomiólise e falência nefropulmonar como seus constituintes principais.

O aumento da creatininaquinase e a linfocitopenia foi encontrado em 62% e em 61% dos casos, respectivamente. A VM foi necessária em 66%, e o óbito ocorreu em 58% dos pacientes, em decorrência de pneumonia hospitalar, provavelmente, secundária à lesão primária do epitélio respiratório provocada pelo vírus Influenza Pandêmico (H1N1)2009, e/ou pela ação secundária de citocinas e de outros fatores da intermediação inflamatória.

A evolução de pacientes com mais de 15 pontos da escala APACHE II representou gravidade extrema. A insuficiência respiratória requerendo intubação e VM desenvolveu-se, em geral, nas primeiras 24 horas após a admissão hospitalar, com a saturação média de oxigênio situando-se em 71% dos casos na ausência de oxigenoterapia. A PEFP requerida ultrapassou 16 cmH2O. A duração da VM variou entre 7 a 30 dias e entre 4 a 17 dias, nos pacientes que sobreviveram e faleceram, respectivamente. Os estudos radiológicos mostraram opacidades, revelando pneumonia. A mediana da escala APACHE II foi de 14 (média de 4 a 32) pontos, indicando alterações graves.

A administração de antibióticos antes do diagnóstico de Influenza Pandêmica (H1N1)2009 ocorreu em mais da metade dos casos.

Foi observado aumento de desidrogenase lática, podendo exceder a 1000 UI/L (1086 a 6309); da creatininaquinase, com mais de 1000 UI/L (1099 até 5122); e de linfocitopenia, em 100%, 60% e 61% dos pacientes, respectivamente. Esses dados podem indicar a possibilidade da associação de rabdomiólise com alteração glomerular e/ou necrose tubulointersticial aguda.

A infusão de norepinefrina foi necessária em metade dos pacientes durante o período de hospitalização e, em 25% dos casos, foi administrada corticoterapia (hidrocortisona: 300 mg/dia ou metilprednisolona: 60 mg/dia).

A insuficiência renal estava presente em mais de 80% dos casos de morte. Em nenhum dos pacientes com DRAG foi observada síndrome de coagulação intravascular disseminada ou de complicações neurológicas. Os agentes responsáveis pelas infecções hospitalares associadas com a VM foram: Acinetobacter baumanii, Achromobacter xylosoxidans, Staphylococcus aureus meticilina-resistente, Escherichia coli.